A
Caixa Econômica Federal vai abocanhar praticamente todos os recursos destinados
pelo Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para a compra de Certificados
de Recebíveis Imobiliários (CRI), títulos com lastro em financiamentos
habitacionais de bancos. Dos R$ 2,5 bilhões reservados pelo fundo, a Caixa deve
levar sozinha cerca de R$ 2,2 bilhões, o equivalente a 88% do total destinado
para essa linha, conforme apurou o Valor. A Caixa é também o agente operador do
FGTS e foi responsável pela análise das propostas.
O
resultado deixou contrariadas as demais instituições que participaram do
processo. Além da Caixa, pelo menos outros quatro bancos fizeram proposta para
a venda de suas carteiras: Banco do Brasil, HSBC, Itaú e Santander.
Conforme
as regras estipuladas pelo fundo, os bancos deveriam apresentar o volume total
de créditos para a venda e, em caso de excesso de demanda, as propostas seriam
atendidas proporcionalmente ao pedido de cada um. A prioridade é para os CRI da
chamada "faixa I" - com lastro em financiamentos de imóveis até R$
200 mil.
De
acordo com a Caixa, as propostas de venda de CRI somaram R$ 40 bilhões, dos
quais R$ 36,6 bilhões referentes a imóveis na faixa I. No rateio proporcional,
portanto, os bancos levaram menos de 7% do que pediram, e quem fez propostas de
CRI na faixa II, de imóveis entre R$ 200 mil e R$ 400 mil, não levou nada.
Executivos
ouvidos pelo Valor acreditam que a Caixa fez uma proposta de volume muito superior
ao que de fato pretendia vender ao FGTS por saber de antemão o quanto os outros
bancos pediram. Assim, conseguiu levar mais que os outros e satisfazer sua
intenção real de venda.
Para
obter a maior parte dos recursos do FGTS, a Caixa teria feito uma proposta de
securitizar mais de R$ 30 bilhões de sua carteira imobiliária, ou quase 40% de
todo o estoque de créditos com recursos da poupança da instituição. Durante
todo o ano passado, foram realizadas 168 emissões de CRI no mercado brasileiro,
no total de R$ 12,4 bilhões, o equivalente a pouco mais de um terço do que a
Caixa se propôs a emitir sozinha e em uma única operação.
As
instituições, porém, estavam cientes das regras do jogo. "Como já era
esperada uma demanda grande, é natural fazer um pedido maior prevendo um
rateio, mas não nessa magnitude", afirma um executivo, que esperava
receber pelo menos 30% do volume proposto. Questionada, a Caixa não confirmou o
valor proposto por cada instituição.
A
venda de CRI para o FGTS é atraente para os bancos por gerar um funding de
custo baixo, equivalente à variação da TR mais 6,38% ao ano. Do lado do
governo, a ideia de usar uma parte dos depósitos do fundo formado por recursos
dos trabalhadores para a compra de recebíveis imobiliários é uma forma de
ampliar as fontes de captação dos bancos para a concessão de crédito para a
compra da casa própria. Especialistas vêm alertando que os recursos da poupança
em breve não serão suficientes para atender a demanda.
Na
securitização, os bancos transformam parte da carteira de créditos em títulos
que são vendidos a investidores no mercado e, assim, abrem espaço para novos
financiamentos. Para estimular a operação, no fim de 2010 o governo autorizou
os bancos a contabilizar em seus balanços por um período de 36 meses os créditos
imobiliários vendidos a securitizadoras, com redução gradual durante esse
prazo. Antes da medida, a retirada precisava ser feita de uma vez, o que
dificultava o cumprimento da norma que obriga as instituições a direcionar 65%
dos recursos da caderneta de poupança para o crédito imobiliário.
As
propostas de venda para o FGTS são feitas pelas empresas securitizadoras
responsáveis pela emissão dos CRI, contratadas pelos bancos. Não por acaso, a
disputa pela carteira da Caixa foi a mais acirrada, o que derrubou as taxas
cobradas por essas instituição. No final, o banco fechou a emissão com a RB
Capital. Procurada, a RB não comentou o assunto.
Na
última venda de CRI para o FGTS, a Caixa também levou a maior parte dos
recursos, mas a divisão foi mais equilibrada. Dos R$ 2,84 bilhões adquiridos
pelo fundo na ocasião, o banco público levou pouco mais da metade.
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