A motivação inicial é a divisão de gastos, mas o movimento mexe com outros aspectos muito além do bolso.
Morar com estranhos pode lhe parecer inusitado. Não é qualquer um que consegue conviver com as manias e os hábitos de outras pessoas. Porém, essa prática está se tornando cada vez mais comum. Especialmente nas grandes cidades, o movimento de coliving ganha força no Brasil, e cada vez mais pessoas utilizam moradias compartilhadas. Mas por que isso acontece?
Entenda agora o que é coliving, como funciona e o que leva as pessoas a quererem morar juntas.
O que é coliving
Coliving é um novo jeito de morar, em que diferentes pessoas compartilham a moradia em uma mesma casa ou apartamento. A motivação inicial é a divisão de gastos, mas o movimento mexe com outros aspectos muito além do bolso.
Viver em comunidade nunca foi estranho ao ser humano, porém o crescimento das cidades provocou uma individualização dos espaços. Em resposta a esse movimento, o coliving propõe a volta da convivência e da socialização, de maneira consciente e colaborativa.
Apesar de ser uma tendência atual, a prática é antiga. Na Dinamarca da década de 70, na onda do movimento hippie, as ideias de colaboração e integração surgiram com o cohousing, em que comunidades mantinham suas moradias privadas e compartilhavam espaços de convivência.
As bases do coliving estavam lançadas. Porém, de lá para cá, o movimento evoluiu e já propõe respostas para questionamentos contemporâneos. Seria o coliving uma solução para a escassez de moradias urbanas? Seria um modelo de habitação sustentável? Seria uma maneira de reconectar as pessoas? Ele pode ser tudo isso.
Como funciona um coliving
Engana-se quem pensa que coliving é pura bagunça. Cada morador tem seu quarto, mas cozinha, sala, lavanderia e área de lazer são ambientes compartilhados. Por isso, lavar louça, limpar o chão e organizar os objetos são algumas das atividades que entram na divisão de tarefas, assim como pagar as contas e controlar os gastos.
O compartilhamento de espaços, objetos e equipamentos aproxima-se também da prática da economia colaborativa, reduzindo desperdícios e fortalecendo o consumo consciente.
Mas o coliving vai muito além das obrigações. Se a convivência diária pode ser penosa, nada melhor que criar momentos para descontrair. A integração promove a conexão entre os moradores e tende a reduzir possíveis conflitos.
Colaboração, sustentabilidade e integração: essas são as principais premissas para quem quer compartilhar uma moradia.
Como são os espaços de coliving
Espaços de coliving podem ter diversas configurações. Eles podem ser exclusivamente residenciais ou integrados a um coworking. Podem ser instalados em uma casa ou em um edifício inteiro. Podem ser criados por empresas ou por grupos de amigos.
Independentemente do formato, o local deve ser voltado para o compartilhamento e a convivência. Nesse sentido, ambientes planejados tendem a trazer benefícios tanto para o individual quanto para o coletivo.
RIO - Mãe e filha, Andreia e Lara Gama moravam desde sempre num apartamento de 80 metros quadrados em Laranjeiras. Até que, em janeiro deste ano, as duas resolveram se mudar para uma mansão de 700 metros quadrados, no vizinho Cosme Velho. O novo endereço tem jardim, piscina, churrasqueira e outros sete moradores que, como elas, decidiram experimentar a vida numa casa compartilhada. Cada um tem seu quarto, enquanto copa, cozinha, sala, lavanderia e área de lazer são usadas por todos. As tarefas domésticas são divididas, assim como as contas de luz, água e gás.
— Ficamos ricas sem precisar ganhar na Mega Sena. Ganhamos em qualidade de vida, claro, mas principalmente em conteúdo, espiritualidade, diversidade — enumera Andreia, socióloga de 47 anos, que alugou o apartamento de Laranjeiras para um amigo francês de passagem pela cidade.
Estudante de dança, Lara, 19, completa:
— Antes, eu morava no apartamento da minha mãe, com as regras dela. Sinto que essa casa é mais minha. Tenho maior poder de escolha. E a família cresceu. Quando tenho uma questão com a minha mãe, converso com algum dos meninos.
Enquanto termina de se arrumar para trabalhar em sua suíte, localizada no mesmo corredor onde fica o quarto da filha (são nove dormitórios divididos em dois andares), Andreia vai além.
— Quando morávamos sozinhas, eu tinha que falar para a Lara lavar a louça e reclamava quando chegava tarde. Aqui, deu uma diluída. Tenho outros focos. E minha filha participa de todas as atividades. Acho que viver numa casa compartilhada deveria ser uma escola para todos os adolescentes de classe média do Rio de Janeiro — opina.
O estilo de vida em voga é inspirado num movimento que nasceu na década de 1970, na Dinamarca, e foi oficialmente batizado como “cohousing” pelo arquiteto Charles Durrett, nos idos de 1988, na Califórnia. Bem popular nos Estados Unidos e em diversos países da Europa, as comunidades urbanas começaram a ganhar força no Brasil em 2013, inciando por São Paulo. No Rio, pipocaram no último ano, da Zona Sul à Zona Norte. E a tendência, também chamada “coliving”, dizem os especialistas no tema, é de crescimento.
Numa primeira olhada, o esquema lembra a logística das repúblicas estudantis, mas basta tomar um café com um dos adeptos para entender que economizar a grana do aluguel não é a questão central. Trata-se de uma opção feita por pessoas de todas as idades, amigos, amigos dos amigos, casais, irmãos, mães e filhas. A maioria é formada, pós-graduada e bem-sucedida profissionalmente. O objetivo é compartilhar experiências e viver da forma mais sustentável possível.
— O que está acontecendo hoje é um movimento mundial muito lindo, uma transição para outro modo de habitar o planeta. Há um anseio humano em recuperar o que foi sugado pelo sistema. É uma transformação onde tecer vínculos comunitários é essencial — analisa a arquiteta e pesquisadora Lilian Lubochinski, fundadora de uma consultoria chamada Cohousing Brasil
Atividades culturais com renda vertida para investimentos internos são um denominador comum nas casas compartilhadas do Rio. Na Legalaje,localizada na Avenida Niemeyer, rola de um tudo, de shows de mantra a rave. No fim do mês, os moradores vão promover um bazar. São vasinhos de suculentas, mandalas, bolsas e até uma linha de cuecas samba-canção: tudo produzido na casa pelos próprios.
Foi o gosto por moda e por design que uniu a paulistana Paloma Christiansen, o carioca André Felipe Bispo e os mineiros Marcela Santiago e Francisco Rath, o Kiko — todos com seus 20 e poucos anos. Sinal dos tempos, os quatro se conheceram através das redes sociais.
Somos muito conectados com a praia. Eu não tinha condições de pagar aluguel de um apartamento de frente para o mar sozinha. Juntos somos mais fortes.
O quarteto e as agregadas oficiais, Fernanda Bradaschia e Madalena Godinho, continuam abastecendo as redes.
— Caprichamos na cenografia dos eventos que rolam na nossa laje,que já virou um point entre nossos amigos — conta André.
O sentido de comunidade surgiu de forma espontânea na casa. Os três andares, atualmente, são divididos em quatro apartamentos. E há determinados ambientes compartilhados, como a cozinha e a famosa laje.
Fonte: Italínea e o Globo
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